Murderbot, a nova série da Apple TV+, é engraçada, e digo isto mesmo não sendo fã de comédias, mas estes primeiros episódios cativaram-me. Não é, de todo, a minha praia, mas como tem uma forte componente de ficção científica, resolvi dar-lhe uma oportunidade… e surpreendeu-me pela positiva.
As personagens são exageradas e estereotipadas, sim, mas funcionam incrivelmente bem dentro do contexto, tanto nas situações profissionais como nas mais pessoais. A série parece dizer-nos que, fosse há 300 anos ou daqui a 300, os humanos continuarão a ser humanos, com todas as suas manias, inseguranças e contradições. Há algo de profundamente verdadeiro nisso, e a série aborda-o com leveza, mas de forma certeira. As situações absurdas ou dramáticas, seja numa nave ou num planeta desconhecido, servem como lupa para ampliar comportamentos que reconhecemos no nosso dia-a-dia.
A produção é sólida, como já vem sendo habitual nas séries da Apple. Visualmente, o mundo é credível, com um design cuidado e coerente, sem se apoiar em excesso nos efeitos visuais. Nota-se um investimento no ambiente e no tom da narrativa, o que ajuda bastante na imersão. A série consegue manter um equilíbrio entre humor e ficção científica, sem cair no ridículo, ou quando cai é claramente propositado, nem na pretensão.
O grande destaque, no entanto, é Alexander Skarsgård, em particular na voz off do Murderbot. Aquilo que ele diz e aquilo que pensa são coisas bem distintas, e há algo de profundamente humano nesse contraste. A sua expressão apática ou neutra choca com pensamentos carregados de sarcasmo, juízos de valor e observações sobre os humanos que são, ao mesmo tempo, engraçadas e certeiras. Dei por mim a concordar com muitas delas. Se calhar sou eu que começo a identificar-me demasiado com uma inteligência artificial. Ou talvez o Murderbot diga simplesmente aquilo que muita gente pensa, mas não verbaliza.
Numa altura em que vivemos tempos instáveis, com discursos cada vez mais extremos e decisões absurdas a surgirem todos os dias, a forma como a personagem observa o comportamento humano pareceu-me especialmente relevante. Há uma mistura de crítica e cansaço nas palavras dele que, com humor, espelha bem um certo desencanto com a nossa própria espécie. E isso faz-nos pensar, mesmo quando rimos.
A narrativa ainda está numa fase introdutória, estes primeiros episódios não revelam muito da trama principal, mas conseguiram captar o meu interesse. Estou curioso para ver até onde irá o segredo que o protagonista tenta esconder e que tipo de mistérios mais estão por revelar no planeta onde se encontram assim como as aventuras que vêm depois.
Depois da desilusão com The Studio, parece que a Apple acertou finalmente numa comédia que vou querer acompanhar, é uma incursão sólida pelo género.
Os dois primeiros episódios de Murderbot (Diários de Um Assassiborgue, em Portugal) já estão disponíveis na Apple TV+, com os restantes oito a serem lançados às sextas-feiras.
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