Hacks – Crítica da 4.ª temporada

Criada por Paul W. Downs, Lucia Aniello e Jen Statsky, Hacks explora a parceria peculiar entre Deborah Vance (Jean Smart), uma lendária comediante de Las Vegas, e Ava (Hannah Einbinder), uma arrogante jovem escritora. A série começa quando o agente de Deborah exige que ela se junte à novata escritora de comédia numa tentativa de atrair um público mais jovem e inovar o conteúdo das piadas, bem como evitar que o seu espetáculo seja cancelado.

A 4.ª temporada de Hacks arranca imediatamente a seguir ao estrondoso final da 3.ª temporada. Deborah conseguiu concretizar o seu sonho de apresentar um programa de late-night e Ava, contra os desejos da comediante, é a sua guionista principal. O primeiro episódio é muito intenso, com cenas iniciais que poderiam ser tiradas de um thriller, mas, principalmente, é muito divertido. Isto porque Deborah e Ava não se poderiam odiar mais e estão dispostas a fazer de tudo para tornar o trabalho uma da outra num verdadeiro inferno, incluindo plantar roupa interior no escritório do produtor executivo do programa. A melhor parte, no entanto, é serem obrigadas a posar juntas para a capa de uma revista que quer vender a sororidade e o empoderamento feminino na indústria e a relação de Deborah e Ava parece-lhes ser o exemplo perfeito disso. 

No segundo episódio, a pressão aumenta. Apesar da desavença, Deborah e Ava não só têm de colocar um programa de late-night no ar todos os dias, como, aparentemente, têm de salvar o formato televisivo, que “está em apuros”. O programa precisa de ser o late-night mais visto do país, o que implica agradar tanto a “mecânicos como a donas de casa”, mas Deborah teme que Ava a tenha transformado numa comediante de nicho. É aqui introduzida uma das grandes questões da temporada: até onde irá Deborah para manter o seu sonho vivo? Sem surpresas, a resposta parece ser: até onde for preciso. Afinal, Deborah está longe de ser uma santa e já a vimos fazer coisas bem piores do que comprometer a sua autenticidade para conquistar as audiências que o canal exige, muito para desgosto de Ava. Ainda assim, Deborah está apavorada. Mesmo depois de 50 anos a pisar palcos, a comediante começa a ter ataques de pânico. Na crítica que fiz à 3.ª temporada da série escrevi: “Ao longo da temporada, na busca pelo seu sonho de apresentar um talk show, vão sendo desvendadas facetas de Deborah que até aqui desconhecíamos e, se algumas a humanizam, outras mostram o seu pior lado. Todas elas, porém, contribuem para construir uma das personagens mais complexas que já tive o prazer de acompanhar.” E, depois do seu sonho concretizado, o mesmo continua a ser verdade para Deborah. 

Infelizmente, a partir do terceiro episódio, a série perde o gás. Os cameos de celebridades distraem da história, uma storyline preponderante sobre uma estrela do TikTok não acrescenta substância nenhuma à série, prolongando-se demasiado para ser realmente engraçada, e a desavença entre Deborah e Ava, apesar de ficar resolvida pouco para lá do meio da temporada, parece demorar uma eternidade. Sabemos que, inevitavelmente, as duas farão as pazes porque Hacks já nos habituou a essa dinâmica de casal tóxico. O interminável “casa e descasa” de Deborah e Ava faz parte da essência da sua relação e, por isso, parece que nunca nada pode realmente mudar entre elas, por mais feia que seja a briga. Ao longo da temporada temos pequenos momentos que nos mostram o quanto estas mulheres se preocupam uma com a outra, mas quando as duas finalmente se reconciliam, numa cena contida e vulnerável, somos relembrados da razão pela qual continuamos a acompanhar esta relação, mesmo quando ela parece andar em círculos.

Apanhado entre a desavença de Deborah e Ava está um desesperado Jimmy (Paul W. Downs), o agente de ambas, que, enquanto personagem, está sempre no seu melhor quando o mundo à sua volta parece estar a ruir. Nesta temporada, para além de ter as suas maiores clientes em guerra, está a tentar gerir a sua agência com a excêntrica Kayla (Meg Statler), agora promovida a agente. A dinâmica entre os dois é deliciosa e, aqui, atinge novos patamares com a chegada de Randi (Robby Hoffman), a bizarra assistente que Kayla contrata para o escritório. O núcleo foi, durante alguns episódios, a minha parte favorita da temporada. 

Feitas as pazes, Deborah e Ava concordam que o importante é fazer algo do qual elas se orgulhem, independentemente das audiências. Ironicamente, é precisamente aí que o programa se torna o late-night mais visto do país. Depois de uma temporada a apontar os horrores de tentar manter a integridade artística num formato desesperado por audiências, este é um desfecho demasiado romântico para o programa de Deborah, mas claro que Hacks não se fica por aqui e entrega-nos o melhor episódio da temporada, se não da série inteira.

Com o programa no topo, a pressão de manter as audiências culmina na necessidade de entrevistar Ethan Sommers (Eric Balfour), uma enorme estrela de cinema. Ava opõe-se, já que Ethan foi acusado de violência doméstica, mas Deborah está pronta para ignorar a controvérsia para manter o canal feliz e o seu sonho vivo, ainda que não resista em fazer uma piada sobre as atitudes abjetas do convidado. Porém, quando Ethan exige que cortem essa parte da emissão para proteger a sua reputação, Ava acaba por desabafar com a pessoa errada, expondo a censura do estúdio e colocando o seu emprego em risco. A guionista, que passou a temporada a orgulhar-se da sua superioridade moral relativamente a Deborah, volta a mostrar-nos, como no final da 3.ª temporada, um pouco da sua hipocrisia. Depois de confrontada com todas as suas contradições, ela própria admite que se preocupava com a integridade do programa “antes de ser pessoalmente inconveniente” para ela. E é por isso que adoramos Ava. Tanto ela como Deborah são personagens profundamente reais, profundamente imperfeitas e, acima de tudo, profundamente carismáticas. 

O nono episódio é o melhor da temporada porque nos leva numa verdadeira montanha russa de emoções que culmina na descoberta de que Deborah está disposta a tudo para manter o seu sonho, exceto despedir Ava. Depois de aceitar cortar uma piada para proteger Ethan e os interesses do estúdio, Deborah questiona-se agora: Onde está o limite?. Bem, aparentemente, o limite é Ava e aperceber-me disso é suficiente para me fazer chorar. Este episódio podia muito bem – e, sinceramente, talvez devesse – ter sido o final da temporada, mas, em vez disso, temos um último episódio que funciona como uma espécie de epílogo e que sabe a pouco depois do episódio anterior.

A 4.ª temporada de Hacks, bem como as anteriores, estão disponíveis na plataforma de streaming Max. A série já tem uma 5.ª temporada confirmada.

Melhor episódio:

A Slippery Slope (Episódio 9) – O nono episódio foi, para mim, o grande destaque da temporada. É um episódio repleto de reviravoltas que, longe de serem previsíveis, também não são propriamente surpreendentes, já que todas as escolhas das personagens estão profundamente alinhadas com quem elas são – ou, melhor, em quem elas se tornaram. É, por isso mesmo, também um episódio muito comovente.

Personagem de destaque:

Randi – A nova assistente de Jimmy e Kayla pode aparecer pouco e não ser a personagem mais complexa, mas foi uma brilhante adição ao elenco. Randi é capaz de ter as falas mais engraçadas da temporada, elevadas pela interpretação hilariante de Robby Hoffman.

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